sexta-feira, 28 de maio de 2010

Fraternidades.

na pele

É exatamente nesta hora do dia que tenho que me esconder numa pequena fresta que faz sombra no meu quarto, onde não dá pra sentir o sol batendo. Olho em volta e vejo os objetos meio amarelo-acinzentados. Um objeto apenas, com um vermelho bem vivo, se destaca: uma camiseta está pendurada na minha cabeceira.  Parece que ela agora descansa. Enquanto a olho descansar, relembro sua trajetória.

Havia feito alguns pães com tomate, queijo e orégano no forno. Uma delícia. Bebíamos vinho, fazia frio, não escutávamos música. Logo nos trancamos no quarto, logo nos jogamos na cama, logo nos envolvemos como se amanhã fossemos nos separar em quilômetros de distância (e íamos?).

Aqueles gestos prometiam (e era o que eu desejava) que esse ritual (de poder ficar com quem gosta por muitas e muitas noites) não acabasse nunca mais. Começou com um beijo rápido, carícias desesperadas. As roupas já estavam há muito tempo espalhadas pelo chão. Mas ele ainda vestia aquela camiseta vermelha, linda e que naquele exato momento lhe caía muito mal. A arranquei de seu corpo e joguei na cabeceira da cama. Pronto, ali a camiseta ficava bem melhor.

E ficou tão bem ali que agora, passado quase um dia depois daquela noite, com o quarto todo iluminado pela luz amarela-acinzentada das quatro da tarde, ela chamava toda minha atenção. Eu a olhava com ternura e ao mesmo tempo com desejo. O sentimento que ela me despertava seria mais pela cor - da paixão, quem sabe –ou pelo suor, pelo amassado, pelo nosso cheiro, pela forma como tinha sido arrancada, jogada e de como ela teria sido esquecida ali a noite toda?

 

 

no contato

Queria apenas ter como achar cinco reais e entrar naquele bar sem peso na consciência (e no bolso). Queria achar muito mais que cinco reais e reunir todo mundo pra entrar comigo naquele bar. Sim, naquele muquifo, naquela casa meio cambaleante, mas com ambiente intimista. Intimista principalmente em noites como essa: noites de jazz.

Mais uma vez me encontrei sem companhia pra uma noite de jazz. Poderia muito bem ir sozinha. Mas não quis, não tive coragem. Não foi fraterno da minha parte e nem de ninguém.

Ao sair caminhando, desiludida, meus pensamentos foram longe. Me senti oposta em relação a personagem de Iréne Jacob em A Fraternidade é Vermelha de Kieslowski. Suas relações sociais não seguem um ritmo muito lógico (a princípio). O filme, entre outros muitos assuntos, abstrai sobre o tema ‘comunicação’ e de como ela é entrecortada, distorcida e até manipulada. E mesmo assim, nada é impedido de que as coisas aconteçam como deveriam acontecer. As relações da personagem formam uma teia. O ponto que eu queria chegar é que em alguns momentos sinto que as minhas formam uma linha. E talvez, as relações fossem mais fortes e sinceras se as fossem os próprios nós dessa teia. 

A personagem a procura de seu convidado e recente amigo.

7 comentários:

  1. Percebo que seus textos sempre tem um aroma de comida no ar!
    Lindo e cheiroso!
    BJo

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  2. Eu queria ter 5 reais também, mas eu nao tinha e pela primeira vez em meses tinha uma cama limpa para dormir.

    ps: Irene Jacob é uma gracinha.

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  3. Wie Suss! Fraternidades ou Encontro e desencontro.

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  4. Postei um comentário, mas acho que não ficou registado. Só queria dizer que adoro ler seus textos....
    Ternuras

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  5. Ainda não postei nada sobre butoh, mas é assunto que também me fascina... quando postar te digo...
    ternuras

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  6. Conhece a história portrás do Império dos Sentidos? Post de hoje no Banzai.
    Beijo

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  7. Passei para anunciar post sobre butoh...
    beijo

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Comentários.

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