quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O levantar vôo.


O coisas que andam no ar sentiu-se diferente. Depois do último post as coisas mudaram.
Um pouquinho mais amadurecido, mas ainda sim muito sentimental e escasso em teorias e conceitos, está numa morada diferente e o endereço é este aqui: http://cautemoutroblog.wordpress.com/

Te vejo lá!  :)

sábado, 24 de setembro de 2011

Lembrança, trauma e rito de iniciação.


Eu tinha a bochehca três vezes maior do que hoje só que meu corpo era três vezes menor, o que deixava o conjunto da obra um tanto quanto desproporcional. De acordo com depoimentos recolhidos de familiares e amigos, era uma criança calma. Podia passar horas inventando situações, pessoas e objetos imaginários, como se estivesse em estado de transe. Quando frequentava teatros infantis, dentre as crianças eufóricas, eu era uma das poucas que fixava o olho nos personagens fantásticos e se concetrava na história. Por não ter irmãos e nem primos com idades próximas à minha, inventava alguns amigos imaginários. O número de amigos imaginários que surgiram era tão grande que eles brigavam por disputa de melhor amigo. Tudo era muito calmo até que um dia a escola que estudava nos levou ao MAM (Museu de Arte Moderna) de São Paulo. Eu devia ter sete ou oito anos de idade. 

Anos depois, duas obras de arte que tinha visto nesta exposição haviam se fixado em minha mente: a obra do porco empalhado de Nelson Leirner e o auto-retrato de Antônio Dias, ambas produzidas nos anos 60.  
Raramente lia ou via alguma coisa na TV que pudesse remeter a essas obras, mas por algum momento, achei que tinha inventado o porco ou coisa parecida. O que me pergunto até hoje é como e por quê tais obras me marcaram tanto. Talvez por ser tão pequena vendo coisas tão chocantes? Afinal, é um porco empalhado dentro de um museu; o outro é um auto-retrato diferente de um homem. Mas esse homem, pensou a bochechuda na época, deve ser mesmo muito esquisito pra se representar assim. Já naquela idade comecei a indagar sobre porque um artista, ou seja, gente grande muito importante e adorada por outras gentes grandes, colocaria um animal naquela situação. Sobre o retrato de Antônio Dias, não cheguei a pensar que o cara era maluco ou coisa do tipo, mas muito me chamava a atenção e me gerava dúvida do por quê se retratar dessa forma. Afinal, o auto-retrato tinha tudo o que um auto-retrato tem: rosto, braços, mãos, corpo; só era um pouco diferente dos auto-retratos que tinha visto.

A infância se sucedeu como havia se sucedido até então: de forma pacífica. O fato de ter gravado tais obras em minha cabeça não atrapalharam noites de sono, nem os estudos e nem as relações com outras crianças. Eu não ficava rememorando essas imagens e nem pensando nelas conscientemente o tempo todo. Fiquei anos sem imaginá-las. O problema disso tudo é que levar uma criança pequena num museu de arte moderna, arte moderna brasileira - importante ressaltar, faz com que suas 'doors of perception' se abram. E o trauma que isso pode gerar, por mais pacífico que ele possa se manifestar, trouxe grandes influências.

Minha cabeça já não era mais a mesma. Me voltava quase todos os dias ao caderninho de folhas brancas e ao giz pastel. Rabiscava cenas do cotidiano representando os familiares de forma desproporcional - mas mantendo na obra, meu sentimento fiel em relação a eles. Na adolescência, ouvia rock pesado enquanto produzia grandes telas de tinta à óleo, como forma de exaurir a efervescência da idade em formas abstratas e em cores fortes. Pode parecer tudo muito normal, mas dentro de mim, dentro da minha cabeça tudo fervilhava.







Foi nesse período de transição entre a adolescência e uma fase mais madura (embora eu não concorde com a fase da qual nossa sociedade chama de 'puberdade'), que comecei a frequentar ambientes artísticos, por assim dizer, alternativos. Anotava num caderninho algumas idéias malucas para executar num futuro próximo, lia livros, via filmes e coisas do tipo. Começava aqui um rito de iniciação, do qual permaneço até hoje (e do qual pretendo sair assim que me for favorável), que chamo de caminho para a transcendência.

Hoje tenho pressa em realizar tudo que adquiri como inspiração, desde meu primeiro choque artístico, lá no MAM. O rito de passagem torna-se necessário, então, no sentindo de levar com calma, sem perder a excitação da criação, o caminho para a transcendência. Caminho provavelmente percorrido por Leirner e Dias. Não quero aqui colocar artista plástico nenhum em pedestal; mal conheço bem a obra de ambos a ponto de fazer uma crítica coerente. Mas quero dizer que na vida, algumas coisas vem sem avisar e se incorporam a nós como que imperceptível. E, se de alguma forma, algo foi apropriado a mim naquele momento, e fez parte do meu inconsciente até então, é porque alguma inclinação a isso eu tenho. Também não quero dizer que as obras fizeram grande influência sobre minha pessoa, mas que foram pontos-chave para tudo que está acontecendo hoje, tanto dentro de mim, quanto na alma de qualquer ser humano que se deixa levar por uma expressiva, sentimental e crítica obra de arte.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

O silêncio.

Há uma certa atmosfera comovente, saudosa e alegre que esse vídeo parece transmitir. Por que será? Talvez ele tenha aquela atmosfera misteriosa que paira sobre todos os geeks  a ponto de twitarem tanto o vídeo, que ele chega a ter sucesso passageiro em programas de TV; talvez pelo ritmo agradável da música, um tanto quanto pobre de notas, e por isso universal, que pode servir pra qualquer propaganda de cartão de crédito ou de maionese light; mas acho que o principal, o que realmente possa cativar neste vídeo, é a simplicidade.

Faz alguns dias que tenho fugido do silêncio ouvindo qualquer tipo de música que minimamente me agradasse. Cheguei a cometer o atentado de deixar a TV ligada.

Este silêncio, porém, devia fazer parte de um momento de reflexão e não de um momento de fuga. Então lembrei-me de poucos dias atrás, quando pensava sobre o silêncio. Quando alguém falece, esse silêncio aparece. Você observa as ruas, as coisas e as pessoas e tudo parece estar estranhamente calmo. Descobri que isso não é simplesmente uma conspiração do universo ou mera coincidência;  na verdade, os barulhos estão lá da mesma forma que sempre estiveram, só que a sensação de uma ausência faz com que você repouse e reflita sobre o silêncio. Situação essa em que poucas vezes descobrimos que ele está lá, pairando sobre o barulho – e sentimos isso inconscientemente.

Também não é fácil aceitar certas mudanças. E contraditoriamente, aceitá-las é como a quebra de um longo silêncio - o que é bom de vez em quando, quando um ciclo se encerra e é necessário começar outro. Aos poucos talvez seja possível conciliar com os dois lados da moeda: silêncio-e-quebra de silêncio.

Esta simpática banda de dois – do vídeo bonitinho-, Birds of Lindigö, fez minha alma sorrir. Em outro vídeo, a garota também saltita nesses bloquinhos de pedras - esses stompstones - com seu acompanhate ao violão. Dessa vez eles tocam  um gracioso cover da música “Bourgeois Shangri-la” de Miss Li (música que tem sequências de notas muito similares a do vídeo acima). Abaixo, segue um vídeo ao vivo da própria Miss Li para mostrar como ela impediu uma situação de silêncio provocada pelas consequências do próprio corpo humano, a rouquidão. Com dor de garganta e voz rouca, ela não deixou de cantar e gritar lindamente.

domingo, 19 de junho de 2011

A volta do ser

A tempestade

Depois da última postagem no blog, em dezembro do ano passado, meu ser saiu de férias para nunca mais voltar. Enquanto ele percorria os quatro cantos do mundo, me encontrava abandonada. Sem ser, sem alma, fiquei desamparada, fria e superficial. Empurrando a vida com a barriga e me arrastando sobre os pés, os meses foram passando. Mas o ser sair de sua morada não é qualquer acontecimento. É algo que exige muita atenção. E mesmo assim eu mal sabia o que estava acontecendo comigo.

É como uma tempestade. De repente vem um raio, um trovão e você está lavando sua alma. Olhando assustada pra pele molhada, me dei conta de que precisava mesmo de um susto, um vômito, um ah!

 

O SOL

O ser retorna silencioso. Entra pela janela numa manhã de domingo, despretensioso. Invade o corpo, o corpo se estremece. Você está de volta. Mais calmo, mais tranquilo.

Para ilustrar a sensação, aqui vai um pequeno trecho de uma dança butoh. Onde o ser é mais que ser. Ele é estar, ele simplesmente é. E ser por ser, estar por estar, é a pura confirmação da existência e da vida.

 

 

E para completar, a música do Secret Garden. Bem leve…

"Um jardim no qual nós pode buscar refúgio quando tempos são ásperas ou reformar-se a alegria ou contemplação".

 

A leveza do ser, pela primeira vez, se torna totalmente sustentável. Como já disse Drummond, “os ombros suportam o mundo e eles não pesam mais do que o peso de uma criança.”

domingo, 26 de dezembro de 2010

Crônica acrônica de Natal

Passo a tarde do dia 24 preparando pratos monumentais. A salada que foi com manga ano passado, esse ano vai com abacate; o frango com batatas vira frango com pimentão e assim vai. O pavê é o mesmo: só acrescentei uma camadinha em cima. Pra dar uma mudada, né? Ano passado a prima tinha 18 anos e esse ano, 19. Como cresceu! As tias envelhecem, os tios bebem cada vez mais cerveja. As crianças que corriam no quintal hoje jogam videogame. E incrível!, tudo é muito igual.

Minha vida, em um ano, mudou muita coisa. Mas o natal é totalmente acrônico. Apesar das mudanças, ele é imutável.

A tentativa, cansativa e maçante mas que deu certo até agora, de manter uma tradição longínqua de famílias específicas que vieram de específicos lugares, nós que por centenas de anos, nascemos católicos por inércia, essa tentativa é pra manter a família unida? É uma tentativa de manter uma tradição?

E tradição necessariamente está ligada a reunir uma família de sangue? Uma reunião da qual várias peças, mas com este detalhe fundamental de que cada peça vem de um quebra-cabeça diferente, se juntam na tentativa de montar um quebra-cabeça único. É essa tradição que queremos manter? E por quê?

Japoneses montam árvores de natal ao estilo europeu. Japonês tem natal? Meriikurisumasu, eles dizem. What?!  Brasileiros, deixemos de lado nossos maravilhosos coqueiros que enfeitam as praias que nos fazem a fama, e vamos pegar nossos pinheiros, nossa frutas vermelhas (esqueçam também a banana e manga, por favor) e vamos vestir nosso negro de branco, casacão e barba; vamos vestir nosso trabalhador de aposentado sorridente e abonado. Vamos passar calor…

Não é crítica, é apenas uma reflexão. A avenida Paulista ferveu ontem. Ferveu de católicos, cristãos, budistas, espiritistas, judeus, ateus, ortodoxos; famílias, grupos de amigos, casais homossexuais, a tia que veio de Campina Grande também tava lá, os modernetes da Augusta também, os cult do teatro e do jazz – pasmem! – também estavam lá. O que nos levou até lá?  Talvez uma ressalva no Jornal da Tarde da Rede Globo (de que seria o último dia de enfeites) tenha suscitado uma esperança última de fazer um último pedido ao Papai Noel. Talvez uma esperança perdida de que o Natal seja aquela época do ano que sabe manter uma tradição. Será?

Na véspera, ajeito as bolas vermelhas da árvore de natal, ligo os pisca-piscas e aguardo os convidados familiares chegarem. Coloco Caetano no toca discos…

De onde nem tempo, nem espaço
Que a força mãe dê coragem
Prá gente te dar carinho
Durante toda a viagem
Que realizas do nada
Através do qual carregas
O nome da tua carne...

O de sempre começa. Mas posso afirmar que apesar de igual, esse ano foi diferente. Por quê? Coloquei amor no que fiz? Deixei de lado questões chatas e mergulhei na comemoração? Estou crescendo, me acostumando?

No dia seguinte caminho pelas ruas do Peruche a procura de uma resposta. As pequenas casas, com seus grandes carros tem suas cadeiras de praia – que queriam estar na praia – fazendo da calçada sua sala. As crianças correm pela rua, os bebês somente de fralda escapam dos braços das mães. O churrasco tá saindo, a cerveja tá gelada e o sertanejo (ao fund, em outro recinto, há sempre um funk) tá tocando. Dou benção à minha vó e ela reza o Pai Nosso antes de partir pra tragédia grega que é o almoço de Natal. Me engasgo nas palavras, não sei rezar. Não nessa língua.

 

Casa da dona Josefina, 25 de dezembro de 2010.

domingo, 10 de outubro de 2010

I just believe in me, Yoko and me.

Cumprindo a parte burocrática e clichê do dia, hoje é o 70º aniversário de John Lennon. Do cabelinho tigela, paletó e ié, ié, ié à barba, cabelão, óculos redondo e give peace a chance, ele não deixou de ser um gênio, um poderoso ativista pela paz e principalmente, um grande artista. Isso é notável. Nosso cérebro já está lavado com essas informações. Tão lavado que a paz, o amor and all that stuff, são, hoje, consideradas, ainda mais por nós, jovens antirevolucionários, como foolish stuff. No, we can’t.

Ele não é Jesus, assim como Jesus não é Jesus (ou Deus, se preferirem). Mas assim como Jesus, como Hendrix, como Luther King, como pessoas normais, ele deixou uma mensagem. Além de ter marcado uma geração inteira (e apesar de tudo, repercurtir hoje, de forma um pouco triste, um sentimento nostálgico negativo, em alguns beatlemaníacos pós modernos), o que  pregava não vinha somente dele. O povo, na verdade, se traduzia em sua figura. (Sem, claro, desmercer outras figuras marcantes como, por exemplo, Bobby Seale, entre muitos outros ativistas e artistas dos quais eu não saberia citar.)

O hairpeace, o make love not war, o power to the people, foi produto de um momento político e histórico acontecendo em um pedaço muito pequeno do mundo (não que o estrago que isso causou fosse de tamanho semelhante). Que forma isso repercuti no hoje e no agora? A meu ver, se repercuti em um asco. Parece-me que nós, jovens, criamos uma aversão ao amor livre, à paz, bla bla bla. It’s bullshit!, podemos dizer.

Se somos jovens da classe média e média-alta do Brasil (e aqui digo por São Paulo, que é onde moro), vivemos uma nostalgia cega de ouvir os grandes cérebros da tropicália, defender uma esquerda política xis,  fumar maconha numa casa chique nos altos do bairro pinheiros, tentando, talvez, copiar um estilo de vida mais ou menos nostálgico e europeu. Ou vamos à rua Augusta à procura de cerveja barata, com nossas calças apertadas, nossos tênis americanos, sejamos punks ou emos, tentando copiar, quem sabe, um estilo de vida boêmio americano ou inglês. Queremos estudar, mas odiamos a instituição escolar, política é chato mas ao mínimo, eu tento me informar. Os mais corajosos se engajam numa causa sem fundo dentro de algum partido. E no fim das contas eu quero trabalhar e reproduzir o modelo de família classe média patriarcal da qual eu vim mas atualmente digo que eu tenho que fazer o que eu gosto.

Se futebol, religião e política não se discutem, a arte é melhor nem existir. Não se pode colocar um assunto como esse à mesa, afinal, não somos jovens com sentimento de mudança, de criatividade, de sonhos, de grandes perspectivas para um futuro melhor. O que é o futuro? Vamos viver o aqui e o agora! Sim, porque somos meros reprodutores de culturas estrangeiras, somos escravos do consumismo, do mercado de trabalho, do diploma, das bolsas da fapesp, das marcas de cerveja. Somos socialmente induzidos a sermos no mínimos simpáticos. “Gente boa aquele cara”, nós dizemos.  Temos que ser, por mais fora do padrão que você acha que é, socialmente aceitáveis. Não somos polêmicos, não fazemos arte, não lutamos por nada plausível.  A discussão é aberta, parece que é tudo lindo, democracia e o diabo a quatro. Afundamos num buraco onde tudo é possível.

Não quero enfatizar que a juventude dos anos 70 foi muito melhor que a nossa. Não quero dizer que vivemos totalmente sem perspectivas. Mas se é tudo liberado, então demos à paz uma chance? Tudo que realmente precisamos é só amor? Tem certeza? Não. Nunca foi, nem entre a juventude que pregava isso. Mas convenhamos que o sentimento da época era mais forte até por motivos óbvios de conjuntura histórica.

Hoje tudo é tão possível que não permitimos nada, a carapuça da ditadura serviu na cabeça dos rebeldes e agora a estamos vestindo. Se você que hoje ouve Imagine (não na versão do Sir Elton John, por favor) e disfarça aquele nó que dá na garganta porque sabe que sentir esse nó é cafona por demais, reflita. Nao é pra você virar neo-hippie, vegetariano ou eco chato. Apenas, quando estiver preso num trânsito, preocupado em pagar suas contas num futuro próximo e entregar aquele trabalho que é cópia do que Nietzsche, Marx e Freud já pensaram por você, reflita. Pense no abstrato, no subjetivo. Faça uma versão eletrônica de Imagine, mas cuidado pra não ficar famoso (porque provavelmente a versão vai ficar um lixo), pense na cultura do desprezo e da luxúria que vivemos hoje (ou que, pelo menos, desejamos muito alcançar) e vamos continuar vivendo.

Não sei que saída tomar. A arte talvez, seja uma saída da qual eu acredito. If you want to be a hero, well just follow me.

Obs.: Este texto foi escrito sob um momento de euforia por parte da escritora.

sábado, 11 de setembro de 2010

Ressuscitar.

Me veio em mente esse termo quando lembrei da morte e daquele certo clichê de que morte nem sempre é um fim mas talvez um começo. E reviver, ressuscitar também não pode ser um novo começo? Sim. Um começo de um fim. De um começo.

O fim do começo do fim aconteceu no final do volúvel ano de 2008. Ano que deixei de ser outra para voltar a ser eu mesma. 

 

o amor

Lembro-me bem que foi quando quebrei meu coração em mil partes que descobri que amar não era aquela obsessão; que amar é fácil, difícil mesmo é cuidar. Eu mesma, sem pensar, ocasionei uma explosão de amor. Explosão destinada ao fim. Explosão que, pelo lado positivo, me permitiu que pudesse amar novamente só que sem o peso que me causava o amor anterior.

Leve, agora, sou livre. E eu sei, porque eu sinto (e já senti uma vez), e isso ninguém pode me contrariar, que eu sei bem que sinto e o que é que sinto. Não por saber explicar em palavras mas por sentir algo que não está nem dentro de mim, nem exterior a mim e muito menos superior a mim. É algo em estado meditativo, do presente, do agora, forte e de muita luz. 

 

a morte

Ainda no estranho ano de 2008 me encontrei, conscientemente pela primeira vez, com a morte. Comigo ela veio de repente mas rastejando ao longo do meu sono por uma madrugada mal dormida. Depois foi aquele social de velório e coisa e tal e o enterro foi a garantia de que não queria ficar ali sobre ossos. Fui pra casa; chorar aos prantos, claro. Não é todo dia que morre alguém que você gosta tanto.

Não era amigo e muito menos de sangue. Mas era ela. Mal sabia que tinha um lugar na minha vida. Mas sim, tinha e sempre teve. Desse jeito que a vida é, só fui perceber quando ela se foi. Enquanto ela ainda estava aqui passamos por tudo juntas apesar da grande disparidade de idade e de vida social.

A cicatriz foi formada. Mas cortes são coisas necessárias. Uma cicatriz de um amor que a morte fez renascer.

 

Um nascimento só pode vir da morte e do amor. O renascimento é esse ciclo de amar e morrer e, muitas vezes, mais do que imaginamos, de morrer e depois amar. Todos os dia amando e morrendo. Esse ciclo é o que constrói o ser.

 

É assim que renascemos, amando e morrendo.

sábado, 12 de junho de 2010

Poesia do movimento.

   As palavras, ás vezes dizem demais. São genericamente consideradas como o ápice da comunicação e da compreensão humana. Porém, há certa contrariedade nisso, ou seja,  mesmo sabendo ser a palavra um ponto forte da comunicação, é  reconhecível que nem tudo é perfeitamente comunicado e compreendido através dela. Porém, a questão não é exatamente essa

abstrair

   Seja falando ou escrevendo, palavras são, muitas vezes, mais objetivas que o movimento.  Mas há um exemplo do uso das palavras que, pelo menos a meu ver, é muito fácil perceber a subjetividade que forma um movimento. A poesia hai-kai, na simplicidade de suas três linhas, mostra muito em poucas palavras. Através da cultura oriental do micro, as coisas são reduzidas no intuito de serem sintetizadas, fáceis de guardar, só que num conceito diferente: de que com pouco se pode fazer muito, de que no micro vê-se o macro e assim, chegando à idéia de que no vazio pode haver completude.

sonho colorido

o sol dança com a lua

você comigo

Carlos Seabra

Vamos embora ver

A neve caindo

De cansaço

                      Estas pimentas:

                      Acrescentai-lhes asas

                      E serão libélulas.

Ah, o velho lago.

De repente a rã no ar

E o baque na água.

                      Molhadas,

                      Inclinadas:

                      Peônias sob a chuva.

Admirável

Aquele que diante do relâmpago

Não diz: a vida foge.

Bashô

Quietude --

O barulho do pássaro

Pisando em folhas secas.

Ryushi

- Quantas maritacas!

O estouro revela

um sorriso contido.

Rafael Noris (blog Hai-kais)

 

 

do sentimento pra fora

   Pina Bausch, mais do que com palavras, parte do movimento para expressar o sentimento. Como ela mesma diz, "o que me interessa não é como as pessoas se movem, mas sim o que as move”. Então, uma ponte com a dança Butoh pode ser estabelecida uma vez que, em uma entrevista, Kazuo Ohno - recentemente de volta ao seu mundo das sombras, é uma  grande perda e também uma grande admiração como ser eternamente brilhante na arte Butoh -  diz:

Cada dançarino tem seu próprio butoh. Não existe um método, porque a dança é a expressão do interior de cada um. Por isso é singular em cada pessoa. Para mim, o butoh é, com palavras simples, apreciar a vida, minha e dos outros.

   Sem mais palavras, deixo aqui algumas imagens em movimento. Imagens que podem renovar a alma. Ou, pelo menos, renovaram a alma de quem interpretou. Ativando o mínimo de sensibilidade que há em cada um de nós e com paciência e atenção, é possível sentir o que não é falado através dessas novas danças, dessas performances.

   No cinema, uma coreografia de Pina Bausch foi utilizada em Hable con ella, de Almodóvar. E no recente e maravilhoso filme alemão, Hanami – Cerejeiras em Flor, da diretora Doris Dorrie, a dança aparece como condutora essencial para canalizar os sentimentos dos personagens.

Coreografia de Pina Bausch em Hable con Ella

Coreografia de Kazuo Ohno para o filme Hanami - Cerejeiras em Flor
 
  
   Para acrescentar, deixo alguns vídeos com danças butoh que tocam o fundo da alma com sua frieza, com seu figurino cru, com rostos fantasmagórico. Esse tocar sombrio que vira fogo e arde, é porque toca – e é essa a verdadeira chave dessa linda perfomance – o verdadeiro sentimento do ser na sua maior distração de um movimento perdido.

Grupo Sankai-Juku, coreografia de Ushio Amagatsu.

Performance de Ikeda Carlotta, dançarina.

Performances de Kazuo Ohno.

 

Links: “A Experiência de Assistir a um espetáculo de Butoh” – Made in Japan:   http://bitw.in/w2  e  Pina Bauch: tudo é dança:  http://bitw.in/w3

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